terça-feira, 29 de junho de 2010

Morning yearning.





Acordou submersa num mar de lençóis com um cheiro que não o seu e ao lado de um corpo ainda adormecido de um estranho.
Devagar assimilou toda aquela imagem e sem barulho saiu por entre as nesgas de sol que iluminavam o seu quarto agora apoderado pela criatura desnudada e que ressonava barbaramente e de boca aberta
Foi sentar-se na varanda. Aquele sol quente fechou os olhos ainda com sono e o vento matinal, ainda fresco, arrepiou-lhe a pele. E sorriu. Num espasmo de memória reviu a noite anterior. 
Mas uma outra memória roubou-lhe as lembranças ainda mornas. E naquela manhã sem sabor, a saudade veio submergi-la no seu manto amargo. Ela era mais uma vitima do Outono e nem o Verão, que ocupava agora a sua cama a fazia ceder.
Foi então que o telefone tocou. Sabia quem era mas não afastou os olhos das casas lá longe. Até que parou e foi desligá-lo mesmo tendo o coração nas mãos por o fazer assim friamente.
Entrou de novo.
- Bom dia. Quem era?
- Ninguém, ninguém. Era engano.
E o estranho agora na sua sonolência desperta beijou-a e sorriu. Depois perguntou:
- Torradas?
Ela não pôde deixar de sorrir e acenar que sim. Ele saiu em direcção à cozinha e ela ali ainda, provou o travo agridoce da liberdade daquela manhã saudosa.
E até comeu as torradas abraçada ao estranho. E não lhe souberam nada mal.




My morning yearning...

domingo, 27 de junho de 2010

Amor, amor!



Filme de amor com beijo no fim, em tecnicolor
(sem a parte da cor)







O amor é ridículo; mas mais ridículo é aquele que evita cair na sua ridicularização.

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Contas.





era só uma questão de números meu amor

( e eu que nem gosto de matemática ).
na divina magnitude da nossa medida
essas contas não contam.




eu + tu = nós, e isso basta-me

domingo, 13 de junho de 2010

Existências.






A razão de existir de um poeta prende-se com a razão de existência de laços entre palavras.

E filho dos dois (in)condicionais amantes, nasce o poema.








"-Mãe,  também posso ser ser poeta?"




quinta-feira, 10 de junho de 2010

Febre.



Esta cabeça a fervilhar de ideias
está a apoderar-se de mim
e estas mãos, de vazio cheias,
prendem estes lábios de marfim.
Não canso as palavras que trago
acolhidas como filhas no peito.
disponho-as nuas e estrago
a solidez de um passado desfeito.
A minha paz tornou delírio sadio
da viagem por oníricos mares,
em que repousei o meu fastio
e os suspiros sem ares.
E padeço desta súbita onda febril
que me arranca os olhos já fechados
e me queima a clarividência pueril,
deixando-me os sentidos prostrados.


quarta-feira, 9 de junho de 2010

adeus, não afastes os teus olhos dos meus.




"adeus, não afastes os teus olhos dos meus."
não vás,
mas larga os laços meus
e traz o tempo p'ra trás.







isto não é um convite.

sábado, 5 de junho de 2010

chegada das partidas.



- adeus então, que me não vou embora.

- pois então adeus, se aqui ficas comigo.



e algures, alguém gritou: não vás!






E que é que isso interessa?



quinta-feira, 3 de junho de 2010

D.



era por ti que eu procurava quando me olhava ao espelho.
por várias vezes tentei passar para o outro lado,
mas acabei por encontrar-te do lado de cá.
talvez estivesse escrito num qualquer fado
ou então nas curvas que o acaso dá.




D, é letra para uma só palavra.







terça-feira, 1 de junho de 2010

Chuva.

soube bem a chuva seca que molhou o chão ressequido e a pele queimada do sol. encontrou-me no meio de uma qualquer rua já "evacuada" perante a ameaça de nuvens mal humoradas. pensei em salvar-me também, mas p'ra quê? deixei-me ficar ali e quando choveu fechei os olhos, abracei-me e deixei-me molhar e dar de beber a esta pele sedenta. e a terra, saciada, suspirou comigo. deixei-me ceder àquele pequeno grande prazer e deixei que as gotas do pecado beijassem avidamente o meu corpo quase moribundo. ai de mim, a quem Deus já não perdoa. nem a água do céu dá paz a este espírito que arde já num inferno que anda aqui sempre comigo.

e no meio de tal deambulação da Razão, perguntei-me em voz alta: "que estás a fazer?" e sem esperar resposta agarrei em mim e corri p'ra casa. (só não sei porquê)